Ref. Ares(2015)4615588 - 27/10/2015
Date de réception
:
27/10/2015
Numero di ruolo pubblicato
:
C-194/15
Numero dell'atto
:
9
Numero di registro
:
997858
Data di deposito
:
30/07/2015
Data di iscrizione nel registro
:
31/07/2015
Tipo di atto
:
Osservazioni
:
Atto
Riferimento del deposito
:
DC44760
effettuato tramite e-Curia
Numero del file
:
1
Autore del deposito
:
Luís Inez Fernandes (R756)
Portugal
MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS
Direção-Geral dos Assuntos Europeus
Tribunal de Justiça
da
União Europeia
Processo n.º C-194/15
Baudinet e o.
OBSERVAÇÕES
DA
REPÚBLICA PORTUGUESA
No pedido de decisão a título
prejudicial submetido pela
Commissione Tributaria Provinciale di
Torino (Itália) relativo à interpretação
dos artigos 63.º e 65.º TFUE em
matéria de eliminação da dupla
tributação jurídica internacional.
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MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS
Direção-Geral dos Assuntos Europeus
Lisboa, 30 de julho de 2015
Meritíssimos Senhores Presidente e Juízes
do Tribunal de Justiça da União Europeia
O
Governo português, representado por Luís Inez Fernandes,
Margarida Rebelo e João Martins da Silva, na qualidade de agentes, tendo
sido notificado do pedido de decisão a título prejudicial submetido pela
Commissione Tributaria Provinciale di Torino (Itália), no processo
C-194/15,
tem a honra de apresentar as suas observações ao abrigo do artigo 23.º do
Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça, o que faz nos termos e
com os fundamentos seguintes:
I – Matéria de facto
1.
No âmbito de um recurso interposto no processo principal pela
recorrente, litígio esse que determinou que o tribunal nacional tenha
submetido a presente questão prejudicial e que respeita a liquidações de
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imposto sobre o rendimento das pessoas singulares referente aos exercícios
fiscais de 2007 e 2008, pretende-se saber se a recorrente pode, ou não,
deduzir ao imposto devido em Itália, Estado da sua residência, o montante
integral da retenção na fonte efetuada em França, pela sociedade «Paul
Ricard S.A», quando do pagamento de dividendos à recorrente.
2.
Os factos relevantes referentes ao litígio podem resumir-se do
seguinte modo. Nos anos de 2007 e 2008 a recorrente, residente em Itália,
detinha uma participação acionista qualificada na sociedade «Paul Ricard
S.A», a qual se encontrava estabelecida em França e pagou, nos anos em
causa, dividendos à recorrente.
3.
Nos termos da “Convenção destinada a evitar a dupla tributação,
celebrada entre a República Italiana e a República Francesa em 5 de Outubro
de 1989” (a seguir “CDT”), a sociedade «Paul Ricard S.A.» reteve na fonte,
em França, um montante equivalente a 15% do valor ilíquido dos dividendos a
receber pela recorrente.
4.
Na sua declaração de rendimentos entregue em Itália, a
recorrente pretende deduzir do imposto devido em Itália o montante integral
da retenção na fonte efetuada em França.
5.
A Administração Fiscal italiana considera que tal crédito de
imposto de origem estrangeira, naquele montante, é ilegal, por exceder o que
resulta da articulação entre a CDT e a sua legislação interna.
6.
Em síntese, com este processo prejudicial pretende-se
essencialmente apurar em que medida a retenção convencional efetuada pela
sociedade francesa sobre os dividendos pagos aos contribuintes pode, ou
não, ser deduzida do imposto italiano por eles devido.
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II – Questões submetidas pelo tribunal de reenvio
7.
Nestas circunstâncias, a fim de decidir o recurso interposto da
decisão de recusa da dedução, o órgão jurisdicional de reenvio considera
pertinente que o Tribunal de Justiça da União Europeia se pronuncie, a título
prejudicial, sobre a seguinte questão:
Devem os artigos 63.° TFUE e 65.° TFUE ser interpretados no
sentido de que se opõem à legislação de um Estado-Membro nos
termos da qual, quando um residente desse Estado-Membro, acionista
de uma sociedade estabelecida noutro Estado-Membro, recebe
dividendos tributados nos dois Estados, a dupla tributação não é
compensada pela imputação, no Estado de residência, de um crédito
de imposto pelo menos igual ao montante do imposto pago no Estado
da sociedade que distribui os dividendos?
III – Enquadramento jurídico
8.
Perante a questão prejudicial em apreço, importa conhecer, por
um lado, o teor da CDT celebrada entre a República italiana e a República
francesa e, por outro, o da lei interna italiana.
9.
Nos termos do artigo 10.° da CDT:
«
1. Os dividendos pagos por uma sociedade com sede num Estado a um
residente de outro Estado são tributáveis neste outro Estado.
2. Porém, esses dividendos também são tributáveis no Estado onde está
sedeada a sociedade que os paga, em conformidade com a legislação
desse Estado, mas, se a pessoa que recebe os dividendos for o seu
efetivo beneficiário, o imposto assim aplicado não pode exceder:
[...]
b) 15% do montante bruto dos dividendos, em todos os outros casos».
10.
Ou seja, nos termos da referida CDT, e em consonância com o
Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património da OCDE (a
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seguir “modelo OCDE”), existe aqui uma situação de competência tributária
partilhada entre o Estado da fonte e o Estado da residência.
11.
Para fazer face às situações de competência tributária partilhada
de ambos os Estados, ou seja, o da fonte e o da residência, e em que se
concretiza efetivamente a tributação nos dois Estados contratantes, dispõe o
artigo 24.º da referida CDT que quando elementos de rendimentos tributáveis
em França estiverem incluídos na base tributável do imposto sobre o
rendimento em Itália, este último Estado «
deve deduzir dos impostos assim
calculados o imposto sobre o rendimento pago em França [...]», sendo certo
que, em qualquer caso «[…]
o montante da dedução não pode exceder a
parte de imposto italiano imputável aos referidos elementos de rendimento na
proporção em que estes participam na formação do rendimento total».
12.
Por sua vez, segundo o despacho de reenvio, a lei interna
italiana determina, nos termos do artigo 3.º, n.º 1, do Decreto do Presidente
da República n.º 917, de 22 de dezembro de 1986, na redação dada pelo
Decreto Legislativo n.º 344, de 12 de dezembro de 2003, publicado no G.U.
n.º 302, de 31 de dezembro de 1986 - S.O. (a seguir «
Texto Único relativo ao
Imposto sobre o Rendimento» ou «
TUIR»), o seguinte:
«
O imposto é aplicável ao rendimento global do contribuinte, o qual, no
que respeita aos residentes, é constituído pela totalidade dos
rendimentos que possui, após dedução dos encargos dedutíveis
indicados no artigo 10.°».
13.
Essa norma deve, no caso em apreço, ser interpretada em
consonância com o artigo 47.º, n.º 1, do TUIR, que dispõe que:
«
Sem prejuízo dos casos referidos no artigo 3.°, n.° 3, alínea a) 1, os
rendimentos distribuídos, sob qualquer forma ou denominação, pelas
sociedades ou pelas entidades indicadas no artigo 73.° [...]
fazem parte
do rendimento tributável global, até 40% do seu montante».
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14.
No que respeita aos rendimentos provenientes de outros
Estados, o artigo 165.º do TUIR, determina o seguinte:
«
Se rendimentos obtidos no estrangeiro concorrerem para a formação do
rendimento global, os impostos pagos a título definitivo sobre esses
rendimentos no estrangeiro podem ser deduzidos do imposto líquido
devido» e isto
«até ao montante da parte de imposto correspondente à
proporção entre os rendimentos obtidos no estrangeiro e o rendimento
global [...]» e, como tal, «[
s]
e o rendimento obtido no estrangeiro contribuir
parcialmente para a formação do rendimento global, o imposto
estrangeiro deve igualmente ser reduzido na mesma medida».
15.
Por fim, considerando a questão prejudicial, deve-se ter
presente o prescrito pelos artigos 63.º e 65.º TFUE. Assim, determina o
referido artigo 63.º que:
«
1. No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas
as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre
Estados-Membros e países terceiros.
2. No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as
restrições aos pagamentos entre Estados-Membros e entre Estados-
Membros e países terceiros».
16.
Prescrevendo o artigo 65.º TFUE o seguinte:
«
1. O disposto no artigo 63.º não prejudica o direito de os Estados-
Membros:
a) Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que
estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em
idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar
em que o seu capital é investido;
b) Tomarem todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às
suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de
supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de
declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação
administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões
de ordem pública ou de segurança pública.
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2. O disposto no presente capítulo não prejudica a possibilidade de
aplicação de restrições ao direito de estabelecimento que sejam
compatíveis com os Tratados.
3. As medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem
constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição
dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida
no artigo 63.º.
4. Na ausência de medidas ao abrigo do n.º 3 do artigo 64.º, a Comissão,
ou, na ausência de decisão da Comissão no prazo de três meses a contar
da data do pedido do Estado-Membro em causa, o Conselho, pode adotar
uma decisão segundo a qual as medidas fiscais restritivas tomadas por
um Estado-Membro em relação a um ou mais países terceiros são
consideradas compatíveis com os Tratados, desde que sejam justificadas
por um dos objetivos da União e compatíveis com o bom funcionamento
do mercado interno. O Conselho delibera por unanimidade, a pedido de
um Estado-Membro».
IV – Apreciação jurídica: legitimidade da regulação sub
judice
17.
A título de observação preliminar, sublinha-se que a questão
submetida pelo órgão jurisdicional nacional se refere apenas à
compatibilidade das disposições legislativas italianas em causa com os
artigos 63.º e 65.º TFUE e não com o artigo 49.º TFUE.
18.
Na verdade, da decisão de reenvio não resulta, de forma clara,
qual a natureza da participação da recorrente na sociedade «Paul Ricard
S.A.», no período em questão. Todavia, há a referir que, segundo
jurisprudência constante, exerce o direito de estabelecimento, na aceção do
artigo 49.° TFUE, o sujeito passivo residente num Estado-Membro que detém,
no capital de uma sociedade com sede noutro Estado-Membro, uma
participação que lhe confere
uma influência certa sobre as decisões dessa
sociedade e lhe permite
determinar as respetivas atividades.
19.
Em todo o caso, no presente processo, os princípios que
deverão presidir à análise são, no entender do Governo português, idênticos
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para efeitos de aplicação dos dois artigos 49.º e 63.º TFUE, pelo que o
essencial é saber – dando resposta à questão prejudicial – se o Estado
italiano, enquanto Estado da residência da recorrente, está, ou não, obrigado
a eliminar a dupla tributação jurídica internacional, através da concessão de
uma dedução “
pelo menos” – na expressão utilizada pelo Tribunal de reenvio
na formulação da questão prejudicial – igual ao imposto efetivamente pago no
Estado da fonte, no caso em apreço a França, ou seja, em substância, a
utilizar o método de “imputação integral”.
20.
Como é sabido, a prática internacional tem vindo a admitir,
como método adequado de eliminação/atenuação da dupla tributação jurídica
internacional, o método designado por “imputação normal” e as suas
adaptações –
vide artigo 23.º-B, n.º 1, segundo parágrafo, do Modelo OCDE.
21.
Por conseguinte, a questão que se coloca consiste em saber
se, ao agir segundo o determinado na sua lei interna e na CDT entre a
República italiana e a República francesa, sobre a eliminação da dupla
tributação jurídica internacional, a administração fiscal italiana está a atuar em
violação da liberdade de circulação de capitais, tal como esta se encontra
definida nos artigos 63.º e 65.º TFUE.
22.
Ora, nesta matéria da eliminação da dupla tributação jurídica
internacional, a jurisprudência do Tribunal de Justiça tem sido clara. Quando
dois Estados tributam o mesmo rendimento (o dividendo) na esfera do mesmo
contribuinte, existe um caso típico de exercício paralelo de competências
fiscais de dois Estados com jurisdição fiscal.
23.
Isto não significa, é claro, como aliás o Tribunal de Justiça já
deu conta, que possa existir um tratamento menos favorável de um dividendo
externo (
v.g. um dividendo pago por uma sociedade residente em França a
uma pessoa singular residente em Itália), face a um dividendo interno (
v.g.
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pago por uma sociedade residente em Itália a uma pessoa singular residente
em Itália), num mesmo Estado.
24.
Mas, não é essa a situação subjacente aos presentes autos. Da
decisão de reenvio não decorre que o Estado italiano tribute de forma mais
desfavorável os dividendos de origem externa. No caso em apreço, a
tributação mais elevada não decorre das normas de um Estado, mas sim do
exercício paralelo de competências fiscais por dois Estados distintos.
25.
O Tribunal de reenvio apresenta o seguinte exemplo numérico:
«
- no caso de um dividendo de 100.000 euros, distribuído por uma
sociedade francesa, é aplicável ao seu montante bruto uma retenção
convencional de 15%, num total de 15.000 euros;
- o dividendo líquido obtido pelo titular das participações é, portanto, de
85.000 euros;
- por sua vez, a base tributável do dividendo em Itália, correspondente
a 40% do montante bruto, é de 40.000 euros;
- na hipótese de uma taxa média de 30%, o IRPEF devido ao Estado
italiano sobre uma base tributável de 40.000 euros é de 12.000 euros;
- dos 15.000 euros já pagos em França a título de retenção na fonte, os
contribuintes teriam o direito de deduzir do imposto apenas 40% da
retenção efetuada em França, isto é, 6.000 euros, e, em contrapartida,
estariam obrigados a pagar para efeitos de IRPEF os restantes 6.000
euros de imposto líquido aplicável;
- por conseguinte, sobre o dividendo bruto de 100.000 euros sofreriam
uma tributação global de 21.000 euros 9.000 euros dos quais devido ao
facto de não se ter deduzido 60% da retenção efetuada no
estrangeiro».
26.
No entendimento do Tribunal de reenvio, isto conflitua com o
tratamento dado a um dividendo interno, que concorreria apenas em 40% do
seu montante para a formação do rendimento coletável e que no caso de um
dividendo de 100.000,00 EUR, assumindo uma taxa média de 30%
1,
conduziria a uma tributação global de 12.000,00 EUR.
1 A decisão de reenvio não elabora se existe qualquer outra diferença de tratamento entre os
dividendos de origem externa face aos dividendos pagos por sociedades residentes em Itália.
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27.
De facto, existe uma discrepância da tributação global entre um
dividendo pago por uma sociedade estabelecida em Itália e um dividendo
pago por uma sociedade estabelecida em França.
28.
Contudo, essa discrepância não ocorre por força da tributação
no Estado da residência que, utilizando o próprio exemplo carreado aos autos
pelo Tribunal de reenvio, só tributa em 6.000,00 EUR o dividendo recebido de
uma sociedade estabelecida em França, por contraposição aos 12.000,00
EUR cobrados em caso de o dividendo recebido ter sido pago por uma
sociedade estabelecida em Itália.
29.
Esta discrepância do resultado global de tributação não decorre
pois de uma qualquer tributação mais elevada por parte do Estado da
residência da recorrente face aos dividendos pagos por sociedades
estabelecidas fora de Itália, mas sim do exercício concorrente de uma
competência tributária por outro Estado – que também tem uma pretensão
legítima de tributar.
30.
Com efeito, os sistemas de impostos diretos continuam a ser da
competência nacional de cada Estado-Membro, havendo, em consequência,
necessidade de repartir a competência fiscal quando da tributação de um
rendimento com conexão efetiva a mais que um Estado.
31.
Essa necessidade de repartir a competência fiscal, como
acontece com as demais disparidades, deve distinguir‑se das restrições
proibidas pelo direito da União, porque não resulta apenas de um regime, mas
sim da coexistência de dois regimes fiscais separados – isto é, nenhum dos
regimes fiscais, por si, é responsável pela desvantagem fiscal – disparidades
essas que, sublinhe-se, continuariam a existir mesmo que os sistemas fiscais
nacionais possuíssem normas exatamente iguais.
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32.
No direito fiscal internacional, a regra geralmente aceite, na
medida em que se pretenda evitar a dupla tributação jurídica, é a de que
compete ao Estado da residência decidir se quer ou não evitá-la e de que
modo. Por exemplo, um Estado pode decidir evitar a dupla tributação jurídica
unilateralmente ou por meio de uma convenção preventiva da dupla
tributação, podendo utilizar um método de isenção ou um método de crédito
do imposto pago no estrangeiro.
33.
Nos termos do direito da União, a faculdade de escolher entre
estes critérios e de, através deles, atribuir a competência fiscal compete
unicamente aos Estados-Membros.
34.
Atualmente, não se encontram critérios alternativos no direito da
União e não está prevista qualquer base jurídica para a fixação destes
critérios.
35.
Como se pode ler no acórdão de 14 de Novembro de 2006 do
Tribunal de Justiça,
Kerckhaert-Morres, C-513/04, n.ºs 20, 22 e 23:
«20.
Em circunstâncias como as do caso em apreço, as consequências
desfavoráveis que pudessem resultar da aplicação de um sistema de
tributação dos rendimentos como o do regime belga em causa no
processo principal decorrem do exercício paralelo por dois Estados-
Membros da respetiva competência fiscal. (…)
22.
Ora, o direito comunitário, no seu estado atual e numa situação
como a do processo principal, não prescreve critérios gerais para a
repartição das competências entre os Estados-Membros no respeitante
à eliminação da dupla tributação no interior da Comunidade. Com
efeito, abstração feita da Diretiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de
Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às
sociedades‑
mães e sociedades afiliadas de Estados-Membros
diferentes (JO L 225, p. 6), da Convenção, de 23 de Julho de 1990,
relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correção de lucros
entre empresas associadas (JO L 225, p. 10), e da Diretiva 2003/48/CE
do Conselho, de 3 de Junho de 2003, relativa à tributação dos
rendimentos da poupança sob a forma de juros (JO L 157, p. 38), não
foi adotada, até hoje, no quadro do direito comunitário, nenhuma
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medida de unificação ou de harmonização visando eliminar as
situações de dupla tributação.
23.
Por conseguinte, compete aos Estados-Membros tomar as medidas
necessárias para prevenir situações como a em causa no processo
principal, utilizando, nomeadamente, os critérios de repartição seguidos
na prática fiscal internacional. É esta, essencialmente, a finalidade da
convenção franco-belga, que procede a uma repartição da
competência fiscal entre a República Francesa e o Reino da Bélgica
nestas situações. (…)».
36.
Instado, uma vez mais, a decidir sobre a mesma matéria, o
Tribunal de Justiça reiterou o que já havia explanado anteriormente. A este
propósito, veja-se o acórdão de 16 de Julho de 2009,
Damseaux, C-128/08,
de que se transcrevem os n.ºs considerados mais relevantes para a decisão
dos presentes autos:
«26 (…) [O]
s dividendos distribuídos por uma sociedade com sede num
Estado-Membro a um acionista residente noutro Estado-Membro
podem ser objeto de dupla tributação jurídica sempre que os dois
Estados-Membros decidam exercer a sua competência fiscal e sujeitar
os referidos dividendos a tributação na esfera do acionista.
27.
Por outro lado, o Tribunal de Justiça já declarou que os
inconvenientes que podem resultar do exercício paralelo das
competências fiscais dos diferentes Estados-Membros, desde que esse
exercício não seja discriminatório, não constituem restrições proibidas
pelo Tratado CE (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Kerckhaert e
Morres, n.ºs 19, 20 e 24, e Orange European Smallcap Fund, n.ºs 41,
42 e 47). (…)
32.
Numa situação em que tanto o Estado-Membro da fonte dos
dividendos como o Estado-Membro de residência do acionista podem
tributar os referidos dividendos, considerar que compete
necessariamente ao Estado-Membro de residência evitar a referida
dupla tributação equivaleria a conferir prioridade ao Estado-Membro da
fonte na tributação desse tipo de rendimentos.
33.
Embora essa repartição de competências estivesse conforme,
nomeadamente, com a prática jurídica internacional, nos termos em
que se reflete no modelo de Convenção fiscal relativa ao rendimento e
património elaborado pela Organização de Cooperação e
Desenvolvimento Económicos (OCDE), designadamente do seu artigo
23.°-B, é ponto assente que o direito comunitário, no seu estado atual e
numa situação como a que está em causa no processo principal, não
prescreve critérios gerais para a repartição das competências entre os
Estados-Membros no respeitante à eliminação da dupla tributação no
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interior da Comunidade (v. acórdãos, já referidos, Kerckhaert e Morres,
n.º 22, e Columbus Container Services, n.º 45).
34.
Por consequência, embora um Estado-Membro não possa invocar
uma Convenção bilateral a fim de escapar às obrigações que lhe
incumbem por força do Tratado (v. acórdãos de 14 de Dezembro de
2006, Denkavit Internationaal e Denkavit France, C-170/05, Colet., p. I-
11949, n.º 53, e Amurta, já referido, n.º 55), o facto de tanto o Estado-
Membro da fonte dos dividendos como o Estado-Membro de residência
do acionista poderem tributar os referidos dividendos não significa que
o Estado-Membro de residência esteja obrigado, por força do direito
comunitário, a evitar os inconvenientes que possam resultar do
exercício da competência assim repartida pelos dois Estados-
Membros.
37.
Assim, face à jurisprudência constante que se expôs do Tribunal
de Justiça, outro não pode ser o entendimento, ou seja, a legislação interna
italiana, que concretiza o estabelecido na CDT entre a República italiana e a
República francesa, em matéria de atenuação/eliminação da dupla tributação
jurídica internacional, não viola o princípio da liberdade de circulação de
capitais, sendo a situação dos autos resultado de disparidade decorrente da
aplicação concorrente de diferentes sistemas fiscais, italiano e francês, e da
inexistência de harmonização da União na matéria em causa.
V – Conclusão
38.
De quanto precede e pelos fundamentos expostos, o Governo
português propõe que o Tribunal de Justiça se digne responder no seguinte
sentido às questões submetidas pela
Commissione Tributaria Provinciale di
Torino (Itália):
Os artigos 63.º e 65.º TFUE devem ser interpretados no sentido
de que não se opõem a uma legislação de um Estado-Membro, como a
que está em causa no processo principal, segundo a qual os
dividendos distribuídos por uma sociedade com sede noutro Estado-
Membro a um acionista residente nesse Estado-Membro podem ser
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Palácio da Cova da Moura, Rua da Cova da Moura, 1
1350-115 Lisboa
Telefone: (00 351) 21 393 55 00 Fax: (00 351) 21 395 45 39/40/41/42
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MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS
Direção-Geral dos Assuntos Europeus
tributados nesse Estado-Membro e a qual limita o crédito de imposto
pago no estrangeiro ao montante de imposto devido nesse Estado-
membro correspondente à proporção daqueles dividendos no
rendimento total tributável.
Os Agentes da República Portuguesa
Luís Inez Fernandes Margarida Rebelo João Martins da Silva
Assinado de forma digital por Luís
Inez Fernandes
Luís Inez DN: c=PT, o=Ministério dos Negócios
Fernandes Estrangeiros, ou=Direcção-Geral dos
Assuntos Europeus, cn=Luís Inez
Fernandes
Dados: 2015.07.30 16:34:37 +01'00'
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